Publicada desde 15/07/1977.
Na Web desde 12/07/1996.
 
A Janela Internacional traz o que acontece na Europa, pelo redator Fabio Seidl.
Edição de Julho de 2006
 

Bola na Janela

Tinha começado a escrever esta coluna ainda durante a primeira fase da Copa. Mas teve Cannes no meio, mil coisas atropelando. Bem, tive que reescrevê-la, agora talvez de uma maneira mais pé no chão.

TODO MUNDO QUERIA SER BRASILEIRO. COM MUITO ORGULHO, COM MUITO AMOR.

Pele Station, na Potsdamer PlatzA primeira impressão que eu tive quando cheguei em Berlim foi também a última, quando saí de Frankfurt: durante a Copa, todo mundo quer ser brasileiro. Talvez, lá no fundo, até os argentinos, que provavelmente só nos odeiam por uma inconfessável inveja.

E sem dúvida, o maior embaixador da nossa cultura, o maior garoto-propaganda da marca “Brasil”, é o próprio brasileiro.

Na Alemanha, até onde não havia jogo do Brasil tinha sempre uma rodinha de samba com gringos com camisa do Brasil. Alguns bebendo caipirinha, em plena terra da cerveja.

A estação de metrô Potsdamer Platz, em Berlim (foto à direita), virou a Pelé Station durante a Copa. Não era Maradona Station, nem Beckenbauer Station. Pena que viajaram no preço da exposição do Rei por lá: 15 Euricos. Alguns dias vazios depois, a organização se tocou e passou para 5 minguelos a entrada.

Os shows da Copa da Cultura, que o ministro Gilberto Gil fez com a Petrobras estavam sempre lotados fosse com o próprio Gil, com a Daniela Mercury, o Marcelo D2 e se o Tiririca fizesse um acústico por lá, os gringos também iriam ver, só porque era do Brasil.

Loja da PeugeotA molecada também queria ser brasileira. Vi um guri fazer birra com os pais porque queria pintar no rosto uma bandeira do Brasil e não da Austrália, o país deles. No aeroporto, um menino alemão que jogava bola com alguns torcedores e disse que o sonho dele era jogar pela seleção brasileira.

Até a loja da Peugeot na Unter Den Linden (foto à esquerda), a avenida mais sofisticada da capital, virou a “Peugeot do Brasil”. Toda decorada de verde e amarelo, vendia Brahma, pão de queijo... Hoje, isso vindo de uma marca francesa, parece uma estranha ironia.

Suco LegalChegou ao ponto de, em Colônia, a classificação da Suécia ser embalada por uma bloco de samba...alemão! O grupo chamava-se Suco Legal (o fundador “chupou” o nome de uma loja que ele foi em Salvador) e era capitaneado por duas alemãzinhas, uma ruiva e uma loura, que tocavam e cantavam clássicos do samba em português com sotaque. E as duas deram um banho nos gaiatos brasileiros que pediram os instrumentos para “ensinar” o samba.

Nas Fan Fest (leia mais abaixo sobre as Fan Fest), os gringos iam atrás de onde estavam os brasileiros. Fosse pelo som do pandeiro, fosse nas festas que eram montadas após os jogos sob os telões. Numa delas aliás, um grupo de suecos protagonizou uma cena campeã. Um brasileiro ensinou a eles uma cançãozinha em português que dizia: “Uh, uh, uh, eu quero é dar o...”

Museu do EsportePostei um videozinho com essa fanfarronice para vocês curtirem aí: http://www.youtube.com/watch?v=h2GUGcmA08I

No Museu do Esporte, também em Colônia (foto à esquerda), estavam expostas duas camisas de futebol que foram leiloadas. A primeira, alemã, original da final de 74, vencida pela Alemanha e assinada por todos os campeões. Outra, usada por Pelé num jogo qualquer em 1971 e assinada só por ele. E a do Rei custava quase o dobro.

Em Munique, o mesmo fanatismo por tudo que fosse brasileiro: o show da Ivete estava esgotado há dias e só não era mais disputado do que o jogo da seleção. A Marienplatz, principal praça da cidade, por pouco não mudou de nome para Brazilianplatz porque a torcida pelo Brasil tomou conta daquilo.

PorconaldoAté o espírito de sacanear os outros fazia o brasileiro se sentir em casa. Fui a um restaurante que serviu um leitão batizado de “Ronaldo”. Não foram poucas as provocações com o nosso craque da camisa número 9. Os australianos por exemplo, cantavam: “Ronaldo Ate All The Pies” ou “Ronaldo, comeu todas as tortas”, o que lá na Austrália, deve ter alguma graça.

Mas esse oba-oba internacional também refletiu negativamente nos estádios. Quem estava nas arquibancadas verde e amarelo era, na maioria, gringo. Por isso, ninguém cantava, nem gritava, nem torcia.

Este fenômeno, curiosamente, só não aconteceu no jogo contra a França, que teve a maioria brazuca, que infelizmente, quando o time começou a ratear, a torcida resolveu torcer contra ao invés de incentivar.

E depois deste jogo, veio a constatação. Não tinha francês fazendo festa, nem mulheres dançando can-can, nada. Um ou outro maluco tocando corneta. Só. A Copa do Mundo é muito mais triste sem o Brasil. Pena que os nossos jogadores não tiveram tanta disposição quanto a nossa torcida.


A COPA DA ADIDAS

Marca mais lembrada nas pesquisas relacionadas a Copa feitas durante o mundial, a Adidas tomou a boca da Nike.

Jogando em casa, a marca marcou sob pressão. Já no aeroporto, várias ações. Duas delas bastante curiosas. Uma mala enorme com onze alças, escrito Kaká +10 e uma taça embrulhada, como se fosse uma encomenda para o Ballack, na esteira de bagagens. Kaká, mala...ok, ok.

Em Berlim, todo mundo curtiu o Adidas World of Football, um mini-parque temático de Futebol que a Adidas montou em Berlim e em frente ao Reichstag, o parlamento alemão.

A atração principal do parque era a réplica do estádio Olímpico de Berlim, com arquibancadas de verdade com telões para que a galera visse o jogo e um campinho artificial onde no intervalo aconteciam ações promocionais.

Em torno do “estádio”, brinquedos e atrações sobre o futebol: máquinas que testavam a sua habilidade nas faltas e cabeçadas, testavam a potência do chute, jogos eletrônicos e interativos, uma megastore da Adidas com produtos exclusivos e uma área de alimentação com McDonald´s e tudo.

A Adidas só não conseguiu travar a procura frenética pelas camisas do Brasil. As lojas da Nike em dia do jogo pareciam que estavam dando as camisas do Brasil de tanta gente lá dentro.

Talvez por isso, nas lojas oficiais da Copa, as Fan Shops, a única camisa de seleção que não era da Adidas era a do Brasil.


FAN FEST

As Fan Fests são uma espécie de Alzirão de luxo. Para quem não é carioca e não conhece a Rua Alzira Brandão na Tijuca: é o lugar que rola um telão, a maior festa e as barraquinhas de churrasquinho de gato e o isopor com cerveja a um real. As Fan Fest eram isso, mas feitas por alemães.

Tinham o status de áreas oficiais dos torcedores na Copa. E cada cidade tinha uma Fan Fest diferente, sempre próxima às principais atrações turísticas e com o kit básico: supertelão com arquibancada e “geral”. Tendas com souvenir, entretenimento promovido por grandes marcas, comidas típicas (ou não) e claro, muita cerveja alemã.

Parece redundância falar em cerveja alemã, mas nos estádios a cerveja (com álcool, contradizendo as recomendações da FIFA) era americana, Budweiser. Uma heresia.

Tive a oportunidade de participar de um seminário da FIFA, em Munique, a convite do meu amigo Marcelo Cordeiro (obrigado, cara!), onde apresentaram como surgiram as Fan Fest.

O conceito foi criado depois de incidentes na Coréia em 2002. Como até então tudo relacionado ao povo na Copa ficava à mercê da espontaneidade popular, telões nas praças e oferta precária de bebida, comida e nada de banheiros. Até que um dia mais de 10 mil pessoas se meteram num quebra-quebra histórico.

Global Fussball HallAí a FIFA teve a idéia de apresentar o projeto para as cidades-sede, algo que ainda proporciona a oportunidade de oferecer espaços de mídia e exploração comercial às marcas locais. E, claro, controla melhor a multidão que só entra apos ser revistada.

Em Berlim, a maior de todas as Fan Fests acabou se transformando num grande complexo. Eram 4 telões (cada um de um patrocinador), que se transformavam em boites ao ar livre após os jogos e estavam integrados à zona da Copa da Cultura do Brasil, ao Adidas World of Football e a um museu interativo em forma de bola, o Global Fussball (imagem à direita).

Em Colônia, a Fan Fest foi espalhada por várias praças históricas da cidade.

Allianz ArenaEm Munique, a Fan Fest foi feita no estádio com a arquitetura mais bonita do país, que fica num vale cercado por um lago. O lugar esteve cotado para receber a Copa, mas o arquiteto do projeto simplesmente não aceitou que mexessem na sua idéia original para ampliar a capacidade do seu Olympiastadion, construído para os Jogos Olímpicos de 1972.

Ou seja, o cliente quis mudar, o criativo disse que não então simbora lá procurar alguém para construir o Allianz Arena (foto à esquerda), o “pneuzão” que muda de cor e que, aliás, teve que mudar de nome durante a Copa, porque com a FIFA os estádios não podem ter nome de empresa.

Já em Frankfurt (foto à direita), dois telões foram colocados sobre o Rio Main e nas margens a galera se divertia se empanturrando, jogando peladinhas e até brincando numa roda gigante patrocinada pela Mastercard.


A ORGANIZAÇÃO NA ALEMANHA

Os alemães não são perfeitos como a gente acha. Mas ok, foram quase. É que num evento do tamanho da Copa, não tem como não dar zica. Nos bares em volta do estádio ou das Fan Fest por exemplo, só cerveja em garrafa. Então as ruas, após os jogos, viravam um mar de caco de vidro.

Estádio de BerlimEm algumas áreas vitais para o bom funcionamento da Copa, como no serviço de informações do metrô ou em algumas grandes estações de trem, faltou gente falando inglês.

O sistema de venda de ingressos foi outra coisa que muita gente reclamou, pela pouca carga de bilhetes. Quem queria comprar acabou ficando com a raspa da mandioca dos patrocinadores.

Um golpe que eu descobri que estavam aplicando no final da Copa e que poderia ter sido facilmente evitado: o malaco pegava os ingressos de quem já tinha entrado e, como NADA acontecia com os ingressos além de passarem num scanner, os revendia como novos, por pequenas fortunas. E era só a organização ter furado os ingressos ou picotado o canhoto...

A polícia não podia ajudar muito quem levou cano dos cambistas, mas agia rápido ao sinal de qualquer outra confusão. E para mostrar sua imparcialidade cobriram nos carros e uniformes as bandeiras da Alemanha. Afinal, durante a Copa, a polícia era neutra.

Esse “protocolo” caiu em Frankfurt, após a vitória da Alemanha nas quartas de final. Os “tiras” (porque é que nos filmes os atores chamam os policiais de tiras se ninguém fala assim na vida real?) resolveram comemorar também e pintaram no rosto a bandeira alemã.

O SHOW DA MÍDIA

International Broadcasting Center, em MunichO seminário da FIFA também apresentou como são transmitidos os jogos. E é tanta tecnologia que boa parte do mundo não vai conseguir assimilar tão cedo.

Por exemplo, até 2006 o mundo todo via praticamente as mesmas imagens dos jogos. Alguns, como nós, até tínhamos uma câmera exclusiva da Globo dando outros detalhes. Agora são disponibilizadas as imagens das 25 câmeras de cada estádio para que cada país possa fazer a sua edição. O problema é que países mais pobres mal conseguem editar com 4 câmeras.

Para agilizar a transmissão, a Alemanha investiu em 8 carros emissores de sinais de satélite que rodam pelo país. O problema é que a África do Sul, país sede em 2010, já avisou que não tem como comprar estes carros (US$ 8 milhões cada).

Vai ser uma grana também construir um complexo do tamanho do Munchen Media Center (foto acima), com espaço para receber equipamentos e estúdios provisórios de mais de 260 rádios e TVs de todo o mundo, como foi este ano. Destas 260 aliás, 13 levando equipamentos de transmissão próprios e gerando sinal exclusivo. A Globo entre elas.

Soube lá também que a Copa já está sendo gravada no novo sistema HD digital, que ainda nem temos capacidade de ver nas nossas TVzinhas. Mas quando tivermos, vamos poder recordar tudo com alta definição.

Infelizmente só não vai dar para melhorar a imagem do futebolzinho que a gente jogou este ano.

Fica para a próxima, se tivermos mais cabeça. E raça.

OS PUBLICITÁRIOS NA COPA

Muitos publicitários brasileiros de várias partes do pais (e de fora do país) estavam na Copa, acreditando que o Brasil que aparece nos comerciais de TV ia fazer bonito também nos campos da Alemanha. Independente do resultado, a galera voltou pra casa com uma experiência única. Nada se compara a uma Copa do Mundo.

Foto histórica: O paulista Fabio São Pedro (FCB Portugal) e os cariocas Sergio Lobo (Leo Burnett Lisboa) e Aline Arantes (também da FCB) estiveram com o humorista Bussunda.

O rubronegro Diogo Mello (McCann Portugal) descolou um autografo do ídolo Júnior antes do Brasil x Croácia.

Dan Zecchinelli (RC-MG) e Carlos Renato (Arcos-PE) corriam noite e dia atrás de ingressos. E com mais disposição que os laterais da seleção.

Carlos “Dedé” Eyer (África) e André Gustavo (JWT-SP) emendaram a Copa com Cannes.

Os “Bemfica Brothers”, Miguel (DM9 SP) e Paulo (Y&R Portugal) com suas perucas que viraram atração turística.

O paulista William Silva (FCB Lisboa) também aderiu ao visual black power.

Luis Coimbra (Foot Entertainment) se juntou aos criativos paulistas Tomás Corrêa e Bruno Ribeiro (Leo Burnett Lisboa) e cariocas Pedro Prado (F/Nazca Rio) e Fabio Seidl (McCann Portugal)

André Kirkelis (Leo Burnett SP) no metrô, mandando um alô pro Brasil.

Fábio Seidl é redator da McCann-Erickson Portugal- Mes/2006)