• Toninho Lima: “O futuro começou com a explosão de um barco em Angra dos Reis”

    Retrato do autor quando jovem. Ou melhor, quando estagiário.
    Retrato do autor quando jovem. E estagiário.

    O primeiro trabalho de que me lembro ter participado, ainda estagiário, foi fascinante do início ao fim. Foram dois dias de filmagem em Angra dos Reis para uma marca de cigarros da Philip Morris chamada Havaí. Não é de se estranhar que a trilha fosse a mesma do seriado que fazia sucesso na tv naqueles longínquos finais dos anos 1970: Havaí 5-0. O filme mostrava um homem solitário em seu barco pesqueiro, um cara rústico, barba por fazer, que vinha cortando as ondas no mar de Angra. De repente, outro barco se aproximava. Trazia homens de aparência sinistra, com barbas espessas e gorros de lã. O barco dos bandidos abordava o pesqueiro e um deles jogava uma bomba em sua direção, já com o estopim acesso. Nosso herói então, sem pestanejar, pegava o seu maço de Havaí que estava no painel do barco e levava um cigarro à boca. Depois, abaixava-se, pegava a bomba acesa, usava o estopim para acender o seu cigarro e a atirava de volta, explodindo o barco dos marginais. O filme terminava com o nosso herói dando uma prazerosa baforada no seu cigarro Havaí e o acorde final da música tão conhecida do seriado.

    Relembrando isso, o que me vem à cabeça é o que aprendi com essa primeira incursão ao mundo da publicidade. Criar qualquer material publicitário é contar uma boa história. O que você precisa saber, dizia Mauro Matos, o então diretor de criação da L&M Propaganda, é como contar uma história e entreter o espectador até o fim da mensagem. Mas isso foi lá no passado, no final dos anos 1970, como eu disse.

    De uns tempos para cá

    O que mais tenho ouvido dizer é que a publicidade como conhecemos está fadada a desaparecer. Que as novas plataformas e os novos consumidores vão exigir de nós publicitários uma profunda revisão dos nossos conceitos. E que a era dos filmes de 30 segundos está simplesmente sucumbindo aos novos formatos possibilitados por um sem número de novidades tecnológicas. Vão sobreviver apenas os profissionais que souberem ser integrados, múltiplos, holísticos e que dominem os segredos dos algoritmos e sua capacidade infinita de produzir engajamento.

    Todas as previsões estavam absolutamente corretas. A não ser por um detalhe.

    Nem sei mais quantas vezes ouvi os arautos do apocalipse dizerem que os criativos de agora estavam condenados ao ostracismo. E que as novas mídias precisavam de outro escopo de criativos, mais antenados com o ambiente digital e ambientados com as novas formas de comunicação. Pior: todas as previsões estavam absolutamente corretas. A não ser por um detalhe. E é este detalhe que está levando muitas agências a rever seus estratagemas, checar as suas novas configurações criativas e, consequentemente, buscar os bons e grisalhos criativos que sabem escrever e contar uma boa história, capaz de entreter o consumidor e conectá-lo à uma marca ou serviço. Voltam à cena os criativos de filmes. Não foi a forma de criar que mudou. Mudou a forma de levar o produto criativo ao consumidor. A elaboração de estratégias, a montagem dos planos táticos, enfim o necessário domínio das novas mídias.

    O problema é que, durante os últimos anos, tentou-se reformatar o criativo. Cheguei a ouvir que certas agências, que sempre se destacaram no cenário nacional e mundial por sua criatividade superior, estavam em pleno processo de extinção.

    Bem, para finalizar, devo dizer que acontece de eu estar envolvido em um processo criativo, neste exato momento, para uma conhecida marca pontocom. Envolve toda plataforma digital que você possa imaginar, com posts, pre-rolls, vinhetas e outros formatos. E contempla todas as mídias online como youtube, instagram, facebook, spotify e os cambau. E sabe o que estamos criando? Filmes. Sim, filmes. Nove ao todo, acredita? Ah, e tem prints também, para mobiliário urbano, com layouts pra lá de caprichados. Parece e é uma campanha completa nos moldes que eu sempre fiz ao longo desses anos todos desde que voltei daquele inesquecível passeio de barco em Angra dos Reis.

    Inovação é isso. Saber fazer o novo reinventando o velho. Desconfio que o futuro da comunicação é apenas um barco ultra moderno, navegando em águas bem conhecidas. Pelo menos para os melhores marinheiros das ideias. E são eles, ainda, que fazem a diferença.

    Toninho Lima

    Toninho Lima é redator, professor na Miami Ad School e articulista na Janela Publicitária

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    Discussão

    1. Antonio Luiz Accioly Netto

      Oi Toninho, muito boa e divertida sua historia. Como todas as que conta. Realmente naquela época as coisas eram ao vivo e a cores…E usar como tema sem pagar royalts uma música devia ser o fino ! Hoje se você jogasse uma bomba num barco de bandidos, ainda que fossem da Al Fatah apareceriam as valquírias do protesto reclamando da violência contra os coitadinhos! Bomba neles, já que a policia não pode fazer isto com os traficantes. Em tempo, você era bem mais bonitinho quando tinha (muito) cabelo.

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